Por Flávia Ribeiro
Estamos aqui num inverno tropical, às voltas com as férias de meio de ano, que na verdade são um recesso escolar de 15 dias e com muitos eventos sociais. Maratonas de aniversários e festas caipiras onde constato que somos incluídos com carinho, educação, muita atenção e cuidado. Eu sou grata por cada movimento de inclusão, recente e antigo. Então se você está lendo e fez um dia algo para nos incluir esse texto é um agradecimento a você.
Mas isso não é de hoje, como sabem os meninos são adolescentes agora e já tivemos muitas tristezas em muitas festas que deveriam ser só motivo de alegria. Eles já foram a muitas comemorações onde bebiam apenas água. Brincavam e bebiam água. Comiam em casa antes e nunca estavam com fome, mas gostariam de ser incluídos. Ainda é assim para muitas famílias alérgicas.
Mudança
Para nós foi mudando progressivamente, até que temos um exército de responsáveis, em geral as mães, mas tem pai também, que nos preparativos das festas dos filhos me pergunta sobre o que servir aos meus filhos. Aceitam sugestões de produtos, conferem rótulos e muitas vezes aceitam ajuda para que a minha prole, ou parte dela, não fique sem um bolinho de aniversário do amigo.
Às vezes, na impossibilidade de sugerir um bolo pronto eu me ofereço para fazer e levar. A maioria reluta, mas acaba entendendo que tem horas que a melhor solução está na minha cozinha. Tem os que me pedem pra levar sem que meus filhos saibam porque fazem questão que eles se sintam incluídos.
Hoje, enquanto eu esperava o horário de saída de uma festa que Maria estava, comecei a escrever esse texto. Hoje ela veio para casa com uma sacolinha com bolo de chocolate, brigadeiros e uma barra de chocolate. Tudo sem leite, sem trigo, sem ovo. Pela primeira vez ela comeu brigadeiro na festa de aniversário de alguém que não é um de nós. “Mãe, o brigadeiro da Luísa é muito bom”, disse com sorriso escancarado e olhos brilhando.
Ingredientes novos
Nos últimos anos, com a adolescência de Pedro e Joaquim chegaram muitos ingredientes novos e muitas possibilidades. No aniversário deles esse ano fizemos uma festinha pros amigos e padrinhos, além das avós. O bolo era inclusivo, nós cinco podíamos comer e todos convidados comeram sem questionar nada. Uma mãe amiga nos disse que era a melhor versão dos nossos bolos que ela estava experimentando.
Os amigos de Pedro comeram e repetiram sem se dar conta que aquilo não era um bolo convencional. No aniversário de Tiel esse ano fizemos um passeio de barco e levei um bolinho bem pequeno para cantar parabéns. O bolo dele foi especial. Dias depois, a minha mãe me perguntou qual receita tinha feito porque estava realmente muito gostoso. Logo a minha mamãe, a especialista em bolos. A tia Helena das crianças também aprovou e dividimos depois da arrumação das tralhas a última fatia.
Vocês já foram excluídos de alguma festa?
Mas essa semana no fim da noite respondi ao storie de uma mãe de alérgicos que ainda está lutando muito por inclusão e engatamos uma conversa no direct. Ela estava com o coração apertado. O filho de seis anos não tinha sido convidado para uma festa de aniversário e nem para a festa junina exclusiva da turminha dele. “Eu acho que é porque tenho falado muito sobre alergia e inclusão”. Aquela frase doeu em mim. Já vivemos algo parecido. Mas também sempre deu muito resultado toda a minha campanha permanente por conscientização.
Ao longo do crescimento das crianças eu escrevi muitos e-mails para professores, algumas cartinhas para pais e responsáveis, fiz algumas matérias e releases para a imprensa, sugeri uma lei municipal, que foi aprovada por unanimidade e falei, falei e falei incansavelmente. Dei aula para professores, evangelizadores e crianças. Fiz palestra onde pude e ainda faço onde tenho oportunidade.
Foco nas gentilezas
Isso dá certo, mas uma coisa eu sei também. Tem gente que não vai incluir nada nem ninguém porque não tem generosidade para isso. Tem gente que nunca vai achar que é importante receber bem um convidado. Tem gente que vai fazer a conta do que comprar para o convidado com necessidades alimentares específicas. Quando eu esbarrei com gente desse tipo, eu simplesmente não esperei nada. Foquei nos queridos e queridas que foram e são tão gentis com a gente.
Mas mesmo assim, quando não nos chamaram para festas e os meninos eram muito pequenos e ficaram magoados, (mas eles nem lembram de quase nada traumático) eu e Tiel fizemos festas grandonas inventando moda com piqueniques ou churrascos que faziam os pais morrerem de incômodo. Os filhos saíam pedindo festas iguais aos dos meus filhos alérgicos, que não comiam brigadeiros, nem arroz com feijão. Muitas vezes também fiz lanches coletivos para todos, mandei comida sobrando para a escola, fiz a nossa melhor receita. Muitas vezes não disse nada sobre os ingredientes e vi bandejas serem esvaziadas.
Força, trabalho e fé
Então aos pais e responsáveis por alérgicos que estão na luta eu digo: não desistam, escolham as batalhas e se precisarem, descansem, tomem fôlego e recomecem a guerra. Também diria para serem agressivos apenas e exclusivamente em situações extremas. O amor é sempre a maior arma.
Citando dois poetas da nossa querida língua portuguesa, eu diria por último que: “são tudo pequenas coisas e tudo deve passar” e responderia que “minha caravela? Ela balança, mas não afunda”.
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